quarta-feira, 4 de maio de 2016

As discussões acabaram por ficar cada vez mais fortes e constantes. O meu coração acelarava cada vez que ouvia as chaves na porta, seguida do ranger da cama da minha mãe e as suas passadas apressadas até á porta. Ele chegou a casa. Nunca gostei de acordar cedo, principalmente porque sabia que iria fazer exactamente as mesmas coisas que fiz ontem.

Apetece-me falar mais dos piores momentos da minha vida.

A minha irmã insitia em ter a televisão no canal das noticias, mas assim que ouvimos Faro até resolvemos prestar atenção. Vi a rua da minha avó Dulce com muito fumo que parecia vir de um vizinho. Resolvi ligar para o meu primo e perguntar o que é que se passava, mas dava impedido. Entretanto liga-me o Tio Balio e com a maior das simpatias apenas pergunta" que merda é que se está a passar?" e desligou. Alguém me disse que a minha Tia Patricia nos iria buscar a mim e á minha irmã e nada acrescentaram. Confusa, vesti-me e esperei. Quando oiço bater á porta é a minha Tia que me diz " eles morreram". Não me lembro muito bem do que ela disse a seguir. Apenas fomos com ela. Chegámos á casa dos pais dela e já estava lá a familia "toda". Falaram sobre coisas estúpidas como: tentarem descobrir como é que tudo tinha acontecidos e quem é que ía ficar com o quê... Foi aí que descobri que aquela familia não é a familia que quero ter. Fomos para casa e durmimos. No dia seguinte a minha mãe foi ao cabeleireiro. 

Old Peace

Começou, como todas flores na primavera
E ao ver o por do sol, falaste finalmente

Começou, com toda a sua intensidade
E com isso cada particula em mim sabia, é claro que sabia.

Que o unico motivo para eu ter visão, seria apenas para te ver
E que ouvir, teria sido apenas para te ouvir dizer que me amas

Irá chegar o dia em que o assunto "temer a morte" será a anedota mais antiga de todos os que já partiram. E aposto que se riem neste momento. Por favor não tenhas medo meu amor, mas irá chegar o dia em que o medo irá se dissipar e que os nossos corpos irão se tornar casas para outros seres vivos em vez de apenas abrigarem os nossos egos. E quando o tempo descobrir os nossos esqueletos e retirar-nos o que uma vez fomos fisicamente, seremos nós para sempre. Morrer torna-se poético e nós podemos fazer um jardim de nós mesmos, e por isso não posso evitar um sorriso.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

A minha vida- parte 1

O meu passado define-me.
Passado que me ensinou que só podes parar de sentir dor quando a tens em demasia,

Vou escrever toda a verdade. O que aconteceu á família Gomes segundo os meus olhos. Muitas das coisas que irei contar poderão não estar por ordem ou data mas farei o possível, visto que nunca me consigo lembrar muito bem, quando é que aconteceu "X" evento.

Vou começar do inicio. Tenho flashs das minhas primeiras lembranças. Lembro-me da casa da minha avó Dulce(mãe da minha mãe) na baixa de Faro junto a uma igreja. Nunca gostei muito dessa casa. Lembro-me de ter medo do corredor e da minha mãe querer pegar fogo á própria mala. Foi a minha primeira lembrança. Lembro-me da mudança que fizemos para a nossa casa na 18 de Junho em Olhão, onde vivia a Lina(minha madrinha) e o filho dela, o João. Lembro-me das paredes grafitadas no meu quarto e de quanto tempo levou até aquela casa ficar limpa segundo os padrões da minha mãe. Lembro-me da minha querida Tia Idália, que foi a pessoa que cuidou de mim desde o meu primeiro mês de idade até aos 6/7 anos. Ensinou-me a rezar e que devíamos agradecer por tudo e que ovos estrelados com açucar é a melhor coisa do mundo. E foi a única pessoa que me ensinou tais coisas desde então, não que eu rezasse ou ligasse muito a isso, mas para ela tinha um significado tão genuíno que me levava a querer acompanhá-la mesmo não acreditando. Eu acreditava nela, e isso bastava-me. Lembro-me de ir para a Dona Geninha e foi lá que fiz a minha primeira e grande amiga, Nicole. Nicole era e é uma das pessoas mais queridas e atenciosas que conheço. Desabafava comigo sobre a mãe dela e seus problemas. Cantava-me músicas pimba que eu absolutamente odiava, mas de certo modo até que aprendi a gostar, porque 5 anos de convivência já é qualquer coisa. Lembro-me do Roberto um rapaz  da minha turma ter gritado comigo e dizer para eu parar de brincar porque tropecei no Francisco e quase o "matei" por ser gorda. Lembro-me desse mesmo rapaz ter dito tempos depois que gostava de mim e insistia que pisar caca de cão mesmo que seja de propósito, lhe iria dar sorte, e fazia-o. Lembro-me do Miguel(irmão mais novo da Nicole) a  visitar na Dona Geninha e de ver os olhinhos dela a brilhar com lágrimas de felicidade. Como eu gostava de ser de ser irmã dela e ver alguém gostar de mim assim. Lembro-me de me aperceber que os meus pais discutiam todos os dias, não sei o porquê de não o ter notado antes. Discutiam logo quando eu estava na parte mais interessante do meu livro. Todas as noites eu lia os meus livros da Disney e insistia em durmir abraçada a eles, eram de capa dura então não havia a preocupação de se estragarem. A minha cassete de video favorita era a do Rei Leão, todas as noites eu e a minha irmã víamos aquela cassete, com o mesmo entusiasmo, como se fosse a primeira e ríamos até chorar na parte das hienas. Até hoje ainda nos lembramos das falas e das letras das músicas. Comecei-me a aperceber cada vez mais que os meus pais discutiam, ao ponto de não conseguir ignorar. Gostava de assistir ás discussões para ver o porquê de tanta gritaria e para ver quem é que tinha razão. Apercebi-me de que as agressões verbais de algum modo evoluíram para físicas e desde aí vi-me obrigada a assistir sempre que podia. Queria defendê-los de eles mesmos se fosse possível. Lembro-me de brincar com a minha vizinha de cima Tânia, e eu achava ela a pessoa mais fixe que podia haver. E foi ela a primeira pessoa que me fez sentir mal por ser da cor que sou. E nunca mais lhe falei, principalmente aos pais dela, por criarem uma criança assim, com deficiência de carácter. Sempre achei que era capaz de cuidar do mundo e sempre senti que fui feita tomar conta de tudo e de todos, uma espécie de avó, mesmo tendo apenas 5 anos. Gostava de andar a pé com a minha avó Perpétua e dizer olá ao sapateiro perto da minha casa, gostava muito do quão pequenina a loja dele era e de quão atafulhada estava. Também passávamos junto ao lar de Idosos ao lado da casa de freiras, e eu insistia que sempre que passava por lá tinha de dar um doce ao velhote da cadeira de rodas que estava lá sempre á porta. Parecia sempre tão triste e eu achava que se eu fico ficava feliz com um doce, ele concerteza também ficaria. Lembro-me de me aperceber de que a minha família era diferente das outras. A minha mãe fazia pequeno-almoço, almoço e jantar para todos nós. Sentávamo-nos na mesa da cozinha e comíamos enquanto estava quente, todos excepto ela que ficava a lavar a loiça ou limpar a cozinha, porque a sujidade só saía quando era ela que lavava. Lembro-me de ouvir a mnha tia Ziza num jantar de Natal gozar com a minha e chamar-lhe de bulémica enquanto a minha mãe estava a caminho da casa de banho. Na altura não sabia o que era, mas não gostei do tom dela nem um pouco, não percebi o porquê de ela chamar um nome obviamente mau á minha mãe e na frente de todos e o pior é que ninguém disse nada. Tempos depois vim a saber que nem todas as mães comem a meio da noite e se sente mal dispostas logo a seguir, e que todas as outras mães se sentam á mesa assim como o resto da família. Sempre pensei que a televisão mentisse a esse respeito, as mães afinal sentam-se mesmo á mesa e comem e não ficam mal dispostas.